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O teatro e os subtextos (Dia nacional do teatro)


Uma das coisas que mais me fascina na tradução da palavra grega para Teatro são os sentidos possíveis do verbo VER. “Théatron” se refere ao lugar físico do espectador e significa "lugar onde se vai para ver". O que queremos tanto ver? Ou o que é que não vemos que é preciso estar no palco, na câmara preta, para então vermos? O que não vemos que é necessária a fantasia para tolerarmos, então, vermos em fim? O que muda em nós ao acessarmos uma visão dissecada deste ou daquele assunto de uma forma viva encenada dentro desta caixa preta? Eu acho este “ver” tão intrigante, ele destrincha e revira um assunto, uma imagem, uma história, uma possibilidade... O público só pode “ver” se escolher por si próprio entrar no jogo e aceitar a convenção que pode ser proposta cada vez de mais formas... Só pode “ver” se o ator realmente “viu” primeiro... E com este “ver” pode criar e reagir a qualquer coisa existente ou inexiste que veio de dentro da alma, do mundo físico ou dos sonhos. Mas “ver” pode ser tão doloroso! E necessário... O teatro é o lugar que infere tanto êxtase quanto sacrifícios, tanto senso de dever cumprido quando de incompletude, tanta responsabilidade ao indivíduo quanto ao coletivo, tudo o que se passa despercebido nas relações cotidianas, à vista grossa, ali no teatro ganha amplitude, fica impossível de ser ignorado, seja na cena ou nos bastidores, no processo ou na estreia. E nem sempre é justo, mas é implacável! Tantos sacrifícios e responsabilidades intrínsecas às escolhas de quem assume este ofício, como o de viver a explorar o mundo incompreendido e impopular dos subtextos, dos contextos, dos símbolos, do debruçar sobre as linguagens verbais e não verbais e seu reverberar! O teatro te possibilita sonhar e transcender para em seguida te chocar com a realidade de um espelho inclemente de nossa finitude a cada fechar de cortinas de pano, cortinas de dias, de processos, intensos ou repetitivos e maçantes, de aplausos revigorantes ou resistência dura e calejada... Faz-nos chorar de rir para em seguida descobrirmos que o riso era da própria desgraça, mas por que não rir? Por que não “ver”? Por que não sentir? Talvez seja esta uma de suas principais funções, arrancar-nos do vicioso “acostumar-se” para nos lembrar como pode ser, já foi ou, de fato, é esta vida! E se ver de fora, se "ver" ali, pode ser transformador. E ainda que haja mesmo o lugar pra todas as formas, públicos, preços e profundidades de teatro, ao deixarmos a plateia ou o palco, não deveríamos nunca estar igual antes, mesmo que não estejamos nunca igual a um segundo atrás...

Sonho de Uma Noite de Verão 11/2014 Cia Jovem Paideia Foto: Anelise Rodrigues Blog Roni Diniz

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