Me fizeram esta pergunta várias vezes e alguns até achavam engraçado. Há exatos 8 anos atrás, eu estava saindo de uma fase difícil de transição, abandono, decepções, normal né? Pelo menos para quem está vivo, ué!? Neste ínterim, fui “obrigado” a rever meus valores, fui obrigado a ME ver e me conhecer muito além da frágil imagem que as nossas relações pintam de nós! Um momento de medos, autoconhecimento, enfrentamentos e, graças a Deus, Jesus, יהוה, Jeová, Jah, Allah, como queiram ou não queiram chamá-lo, eu não me perdi de vez na depressão! Afundava bem ao lado de tanta gente incapaz de ver a dor por detrás de um sorriso, como se “ser visto”, ou sei lá, o que queremos deixar ver ou não, resolvesse alguma coisa do nosso estado! Tá aí o Facebook para provar que não...
Neste tempo de luto, em que tanta coisa morria dentro de mim, onde eu mesmo , meus sonhos e meu “lar” desmoronavam, eu busquei e fui sim ajudado por pessoas, por profissionais, por Deus e, principalmente, por mim mesmo a ver que toda “morte” nem sempre é um fim, traz um renascimento, um recomeço um “raio de sol em grama verde e pés descalços” que só sentimos se “sol-ta-mos” o passado, o pesar e deixamos a vida seguir o fluxo... “O que não te mata, te fortalece” disse minha psicóloga uma vez naquele tempo, frase que me provocou a sair do papel de vítima e a me tornar novamente autor da minha história. Sim, se consultar com um psicólogo bom é uma busca de autoconhecimento e equilíbrio. A depressão é uma doença, precisa ser diagnosticada por um médico, sua incidência é mais comum do que o que se pensa. Muitos sentem vergonha e se negam o que acaba fortalecendo a doença e seus sintomas. Como em todos os ramos da medicina, existem bons e maus profissionais, às vezes, é preciso conhecer alguns antes de descobrir um, com o qual pode dar início a esta jornada para dentro de si, é uma chance potente de descobrir os próprios vícios comportamentais e trilharmos novos passos, só descobre isso quem arrisca e insiste com muita paciência, no meu caso foram 4 anos. Como sempre, nesta fase também houve muita música ressonando em minha mente e esta versão da música “I wish I knew how it would feel to be free” originalmente da Nina Simone, verdadeira Diva, rearranjada pela banda Lighthouse Family, dialogava indescritivelmente tão forte comigo, já fazia um tempo que eu queria muito criar alguma coisa em relação à esta música ou com ela, porém canto mal pra caramba e eu ainda não tinha um envolvimento sólido no teatro para criar algo sozinho, só iria conhecer a Dança uns dois anos à frente. Eu tinha acabado de ganhar a bolsa para cursar Comunicação Social, novos ciclos se iniciariam, tinha acabado de voltar pela primeira vez, depois de adulto, à minha terra natal, Pernambuco (já se passavam 10 anos que nenhum de nós irmãos voltara ali para visitar, exceto minha irmã que voltou pra morar lá de novo e ficou de vez!). Minha vontade e impulso artístico era de estar fisicamente interagindo com esta música, dividi com o Daniel Cuter o trabalho criativo deste vídeo, um amigo e artista com várias afinidades e que me ensinou muito nesta vida de artista-designer-fotógrafo. Rascunhei então, com insistência do Cuter, o meu primeiro roteiro de vídeo, era necessário ter algo de referência antes de começar a filmar, que preguiça de desenhar cena-a-cena antes começar a ação! (risos) Aproveitei para me inspirar no repertório que eu tinha, pois sempre gostei muito de videoclipes e algumas imagens específicas até da publicidade, de filmes, etc (isso pode ser visto no backstage postado no Youtube). O Daniel Cuter sugeriu a praça Pôr do Sol em Pinheiros, passei por lá antes de ontem de ônibus durante o pôr do sol pela primeira vez! Era por onde o Cuter sempre passava perto de ônibus na época... Quando eu vi as fotos do lugar, senti que tinha mesmo algo especial lá, engraçado, de fato um sol se punha em mim pra nascer de novo em breve ou talvez já estava nascendo. Fechamos a equipe com o terceiro artista-parceiro, o Marco Antônio, ex-colega de palco, que estava se formando em cinema e quando contei do projeto, logo se interessou e topou participar. Só faltava a filmadora!!
Neste mesmo tempo, uma amiga, Camila Itokajo, que estava prestes a se casar queria me contratar para filmar o casamento dela, mesmo eu não tendo câmera e nem experiência alguma, esta história fica para outro post! (Eita!) Ela deixou uma câmera HD dela comigo para eu ir me familiarizando com o equipamento, aquela câmera era novidade na época, não lembro o modelo... Formou!!
Após as filmagens no dia 20 de maio de 2008, o Daniel fez toda a edição com muito empenho e talento! Eu quis deixá-lo bem livre nesta etapa, uma vez que era clara a nossa sinergia. O processo de edição é tão detalhado, demorado e cansativo, com mil renderizações, que na maior parte das vezes, ter alguém “em cima”, ansioso com o resultado e que entende um pouco ou “acha” que entende, geralmente só atrapalha e atrasa mais o processo (é minha opinião sincera, risos). Apenas acompanhei o resultado das etapas e fiz o tratamento digital de alguns trechos específicos para ajudar. Claro que se fizéssemos hoje, tudo seria diferente, pra começar eu jamais dublaria! Tinha uma certa mania de fazer as coisas literalmente, acho que a dança que me ensinou a abstrair mais os impulsos durante uma criação. Mas também acho bonito assim, ser um recorte do tempo, dos encontros, do que tínhamos a mão na época, nem tenho palavras para expressar minha alegria quando assisti às cenas captadas! Gosto de ainda, 8 anos depois, sentir o cheiro daquela manhã cinzenta e fria que foi gradualmente ficando azul, dourada, fresca, quente e límpida... Gosto de me lembrar da nossa empolgação e sinergia enquanto filmávamos entre 5 e 6 horas corridas, vislumbrando o resultado, criando, adaptando, aproveitando o que surgia na hora, no espaço, rindo muito, o melhor era mesmo o que estava acontecendo ali na hora! O clipe, o produto, hoje é apenas uma lembrança e uma chave para este mundo de fragmentos, de sentimentos, esta fase, este trabalho...
Pra mim “I wish I knew how it would feel to be free” soava e soa como um hino de liberdade e irmandade extremamente espiritual, um encontro com a própria essência de si, uma “materialização” sonora do que eu sentia na alma pedindo liberdade, pedindo amor, pedindo o direito e espaço de me expressar e “...ser como um pássaro no céu, quão doce seria se eu descobrisse que posso voar, planaria sob o sol, veria lá de cima o mar e cantaria, pois saberia como é ser livre”, no fim o que temos é “um amor, uma vida, temos que carregar uns aos outros!”, foi um chamado, eu atendi, e como é bom me sentir e me ver envolvido por estas mensagens neste vídeo. A caminhada continua...
Assista ao backstage abaixo:
PS: Nesta época, nem sonhávamos que um dia o Youtube teria tantos recursos para vídeos em HD e que as bandas largas seriam como são hoje, por isso o VGA, na época, era mais prático e possível de ser visualizado mais facilmente por mais pessoas, existia até um tamanho máximo indicado. Postei recentemente uma versão em alta no Vimeo com uma pequena falhazinha de renderização (https://vimeo.com/164600942), pois se u tentasse substituir esta no Youtube, perderia o registro do status de visualização interessante que atingiu.
Curiosidades: No vídeo, fragmentos de inspirações e históricos do projeto e da música original por Nina Simone, trecho de One do U-2, cenas de outros videoclipes que eu gosto e nos apropriamos (me influenciou, digerimos e criamos nossa versão) aparecem minhas sobrinhas Carol e Belinha, na época acabaram decorando o refrão! rsrs